Territorialidade em disputa: da emancipação à construção de Campos Borges nos anos 1980
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Como vimos na postagem sobre a defesa de Espumoso, anteriormente postada em nosso site, houve uma grande movimentação para a separação de distritos e criação de novos municípios no estado do Rio Grande do Sul durante o século XX. Esses processos, alguns negados em suas datas de proposição, voltariam a ser o centro de novos pedidos de emancipação no futuro.
Esses documentos são interessantíssimos para entender a história de como se deu a formação moderna da geografia do nosso estado, mesclando censos demográficos, levantamentos e balancetes sobre os futuros municípios e seus munícipes, entre várias outras informações de natureza administrativa. Levando isso em consideração e buscando difundir o acervo do Poder Legislativo, ainda pouco conhecido de nosso público, hoje escolhemos falar um pouco sobre o processo de emancipação e criação do município de Campos Borges, antigo distrito de Espumoso e participante do processo aberto em 1965.
Como já expomos anteriormente, o acervo documental do Poder Legislativo constitui-se de processos com propostas para criação, incorporação, fusão e desmembramentos de municípios, com 142 metros lineares de documentos. O quadro de arranjo constitui um fundo documental, ordenado nas estantes pelos métodos geográfico e cronológico por data de abertura do processo. O acervo é um fundo fechado, de caráter permanente e constitui-se em fontes primárias e únicas para pesquisa. Esse acervo é riquíssimo em informações de caráter administrativo e narra de forma fantástica os caminhos que o estado do Rio Grande do Sul tomou para que constituísse a sua geografia atual.
O processo que abordaremos hoje, como citado mais acima, é o de número 1.608/88-6, de 25 de março de 1988, que trata sobre o projeto de lei de número 64/88. Esse processo deu início à ementa de criação do município de Campos Borges, tendo origem a Comissão de Constituição e Justiça. Com mais de 400 páginas, o processo apresenta um balanço sobre as estatísticas gerais da formação econômica e social da população de Campos Borges e Avelino Paranhos, ainda enquanto distritos de Espumoso. Entre censos demográficos, balanços econômicos, fotografias dos moradores e suas áreas de lazer e moradia, e das construções do futuro município, temos um grande levantamento de dados sobre a possibilidade de criação dessa nova localidade.
O processo se inicia com a fala, em 1969, de Constante Pierezan, um dos primeiros habitantes da região, sobre a história de como a ideia da junção de Campos Borges e Avelino Paranhos surgiu. Em meio a uma fala um tanto quanto mítica sobre a data de 30 de abril de 1936, Pierezan evoca a memória do Major Campos Borges, o então prefeito de Soledade e o encontro dos dois em um evento público. Ali, tendo uma conversa a sós, Pierezan conta sobre o seu desejo de criação de uma sede para a comunidade onde mora e que, se contasse com a ajuda do Major, ofereceria o nome do prefeito de Soledade para a nova localidade. O Major Campos Borges indica para que Pierezan “marque o dia da inauguração, que eu vou me entender com a Câmara [Legislativa]”. Com a então benção do Major e prefeito de Soledade, Pierezan realizou os trâmites necessários para que no dia 14 de maio a inauguração acontecesse. Porém, após muita chuva naquele dia, o Major Campos Borges não pode comparecer ao evento.

Infelizmente, 25 dias após a inauguração da sede de Campos Borges, o Major e prefeito de Soledade, homenageado naquele dia de 14 de maio, viria a falecer, deixando o nome de batismo da sede como uma homenagem ao seu benfeitor. Ao dia de 20 de julho daquele ano, o presidente da Câmara, Reinaldo Eckmann, deu o parecer para a criação da nova localidade. Em 1955, após todo o esforço da comunidade para a constituição de sua sede, Campos Borges foi elevada à categoria de distrito de Espumoso, esse que se constituíra como um novo município do estado no mesmo ano. Baseando-se no plebiscito de 1960, onde mais de 80% da população de Campos Borges votou pela emancipação, criou-se um grande desejo da comunidade por sua emancipação, desejo esse que seria consolidado mais à frente, no ano de 1988.
Com base em toda essa trajetória, se iniciou o processo de emancipação do futuro município. A localidade, após um novo censo demográfico, contava com uma população aproximada de 10.696 habitantes em 1986. Esse número representava um grande salto desde o ano de 1980, último ano em que havia sido aplicado o censo no local (6.959 habitantes à época).
Com o conhecimento disso, deu-se sinal verde para que o processo de separação fosse aberto. Além dessa informação, o dossiê também conta com um detalhado levantamento estatístico sobre as estruturas econômicas, sociais, administrativas e urbanas, contando com censos demográficos e levantamentos dos volumes de bens de seus habitantes, além de fluxos de caixa locais, enumeração das atividades de lazer e recreação da população, mapas da região e do estado, além das bases de assistência básicas à população (escolas, hospitais, farmácias, mercados etc.).

O processo se divide em 4 áreas de levantamento de dados, onde, por meio de grandes apresentações de dados estatísticos, fotografias exemplificativas e vários outros materiais, transcorre como toda a economia da localidade está consolidada e que sim, Campos Borges e Avelino Paranhos teriam possibilidade de ter a sua junção e autonomia, sem que isso implicasse em nenhum mal para a sua população. Essas áreas de levantamento estão divididas entre: saúde, transporte, educação e comunicações. Além disso, há várias ramificações que abordam demais aspectos como minas e energia, comércio interno e externo, exportações, agropecuária etc. São mais de 60 fotografias apresentadas durante o processo que, além de apresentar os aspectos administrativos da emancipação, vão dando rosto à sua população, caracterizando seu dia a dia e deixando todo o processo muito mais humano.