Instrumentos de pesquisa e promoção do acesso aos arquivos: Catálogo Seletivo Escravidão, Liberdade e Tutela – Proc. Judiciais
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Na semana anterior demos início a uma série de postagens para difusão de instrumentos de pesquisa do APERS que acreditamos serem potentes à construção de hipóteses, de reflexão e até mesmo para o desenvolvimento de questões de pesquisa, considerando o acesso às informações salvaguardadas pelo Arquivo Público em tempos de isolamento social. Hoje damos sequência a essa abordagem trazendo o Catálogo Seletivo Escravidão, Liberdade e Tutela – Processos Judiciais, lançado em 2017.
Esse instrumento, que pode ser acessado clicando aqui, foi construído a partir da percepção de que os processos de tutela em questão são bastante ricos para o estudo do contexto da escravização no Rio Grande do Sul, e haviam ficado de fora, alguns anos antes, do escopo do projeto Documentos da Escravidão no RS, sobre o qual voltaremos a falar em outra postagem. Desse modo, a publicação foi produzida tendo em mente que pudesse contribuir
para a materialização de novos conhecimentos sobre a escravização, sobre a luta por liberdade, sobre as relações étnico-raciais, sobre o mito da democracia racial; e que eles contribuam para a construção de uma sociedade pautada pelo direito à reparação, em reposta ao passado escravista, pela diversidade, pela respeito à diferença e pela justiça social. (Apresentação, p. 4)
Qual a relação entre documentos de tutela e escravidão? Talvez nossas leitoras e leitores estejam a se perguntar. Vale a digressão, muito bem articulada na introdução do Catálogo: a chamada Lei do Ventre Livre, ou Lei Rio Branco, promulgada em 1871, dispunha sobre o acesso à liberdade para as e os escravizados que estivessem em condição de alcançá-la – por meio da compra de sua alforria, por exemplo – e para os filhos e filhas de mãe escrava a partir daquele período, ali referidos como "ingênuos". O argumento que conduz a costura desse instrumento de pesquisa, amparado em produções acadêmicas que já se debruçam sobre a questão, é de que, ao garantir para os senhores a possibilidade de escolha entre entregar os filhos de ventre livre aos cuidados do Estado quando completassem oito anos, ou permanecer responsabilizando-se por seu cuidado até a maioridade legal (21 anos), abria-se espaço para o estabelecimento de múltiplas formas de relação social correlatas à escravidão e características do tempo de transição à mão de obra livre, entre apadrinhamento, tutela, cuidado e exploração, que podem ser analisadas a partir de documentos como os descritos no Catálogo aqui evocado.
A partir dessa compreensão inicial, o recorte documental e cronológico de análise para a constituição do instrumento foi construído em diálogo com o manuseio da documentação, definindo-se do seguinte modo:
Na medida em que fomos entendendo que as figuras dos escravos e libertos, dos negros e pardos estavam registradas nos processos a partir da Lei do Ventre livre de 1871, as datas limites para a descrição foram tomando corpo. Inicialmente, pensamos em contemplar os processos desde essa data até a lei de 1888 que aboliu a escravidão. No entanto, passado esse período, ainda encontramos documentos com referência à figura do ex-escravo, do negro e do pardo. Optamos, então, por estender o intervalo por dez anos (...) na perspectiva de possibilitar a visualização das relações de rupturas e permanências, inscritas na documentação, nos primeiros anos do pós-abolição naquilo que diz respeito à tutela.
Para uma aproximação inicial das temáticas suscitadas e de alguns documentos descritos no Catálogo, sugerimos a leitura de três reflexões por nós compartilhadas em 2019, produções resultantes do Estágio Curricular em História daquele ano, quando os estudantes de graduação em formação junto ao APERS puderam apropriar-se do instrumento: Texto 1 | Texto 2 | Texto 3
Que nosso trabalho seja útil e inspirador! Boa leitura.