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Entrevista com Glaucia Giovana Kulzer - Parte 2

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APERS Entrevista - Foto: Divulga APERS

Na semana passada, a historiadora Glaucia Giovana de Lixinski de Lima Kulzer nos relatou brevemente sua trajetória de pesquisa no mestrado e o papel da documentação do Arquivo Público (aqui). Vamos conhecer o restante da entrevista, em que ela nos conta sobre sua atuação no Museu da História da Medicina do Rio Grande do Sul!

4) Além de historiadora, você também é pedagoga. Como seu papel como educadora incide sobre sua atuação como historiadora (e vice-versa)?

Após finalizar o mestrado em história (2009), tive a oportunidade de colaborar com o Museu de História da Medicina do RS, na licença maternidade de Sherol do Santos, em 2010, na época coordenadora educativa. Essa foi a minha primeira experiência em um ambiente não formal de ensino, nesse local contei com os conhecimentos e a gentileza de Sherol, que realizou um treinamento, e também com historiador Éverton Quevedo, que me orientou e me apresentou o acervo e as possibilidades educacionais que esse espaço oferece. O museu permitiu o contato próximo com o acervo ligado à medicina e à educação para o patrimônio e para a saúde. A partir deste momento, realizei uma imersão em estudos sobre educação patrimonial, sobre recursos educativos, construção de jogos, e também sobre a história da medicina e as práticas de saúde. Este contato possibilitou ampliar minha formação como educadora, formas de aprender e mediar o conhecimento de forma acessível. A faculdade de pedagogia permitiu direcionar meus estudos para a educação em espaços não formais e também atuar junto a educação infantil e séries iniciais, e assim, desenvolver atividades lúdico-pedagógicas. Em 2013 retornei ao MUHM como historiadora e pedagoga, o que possibilitou implementar novas ideias de atividades pedagógicas e dar continuidade ao trabalho desenvolvido pelo museu. Tendo a formação de historiadora e pedagoga posso auxiliar tanto nas pesquisas históricas e na construção das exposições, como conceber recursos educativos e pedagógicos, além de realizar mediações e atividades voltadas para o público infantil.

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Historiadora Glaucia Giovana Kulzer
5) Atualmente você trabalha com história da saúde e da medicina. Em que esse campo de estudos pode contribuir em um momento de catástrofe pandêmica?

O campo da história da medicina e da saúde nos permite compreender a realidade social de uma região, estado ou país. É através do estudo de práticas de saúde e saberes, trajetórias médicas e de outros profissionais da área, assim como a história das doenças e de instituições de saúde, hábitos, costumes, objetos que podemos analisar cenários para além de apenas uma perspectiva biológica. Este campo de investigação possibilita reconstruir um contexto histórico, político, econômico do país e verificar as medidas de saúde pública utilizadas para enfrentamento de diversas doenças, da mesma forma que podemos perceber como a sociedade se defronta diante do aparecimento de moléstias e suas consequências no cotidiano da população. A característica interdisciplinar desse campo de pesquisa permite lançar mão de diferentes fontes e métodos para construir narrativas sobre doenças ao longo dos tempos. Ao pensar no momento atual, em que vivemos uma pandemia de grandes proporções, em que milhares de pessoas perdem sua vida, ao mesmo tempo em que outras não as valorizam, estamos diante de incertezas, decisões confusas e muitas vezes falta de empatia e muita dor. A saúde clama por urgência, a vida precisa ser levada a sério, e os profissionais que atuam no combate da covid-19 travam uma luta diária, desgastante contra um inimigo invisível. Nos encontramos deste início de 2019 convivendo em uma conjuntura política que amplia os efeitos da pandemia, aprofundando as desigualdades econômicas e sociais. Para tanto, é necessário captar dados e informações sobre esse momento histórico. Uma das possibilidades desse campo investigativo é utilizar do método da história oral para coletar depoimentos sobre experiências de vida e profissionais, durante a pandemia, a fim de preservar estas memórias enquanto fontes históricas, para futuras pesquisas, contribuindo com o conhecimento científico.

6) Junto ao Arquivo Público e outras doze instituições, o Museu de História da Medicina do RS integra o projeto “Documentando a Experiência da Covid-19 no Rio Grande do Sul”. Na sua percepção, qual é a importância da história oral diante de tanta mortalidade, por um lado, e tanto descaso, por outro?

É muito gratificante para o Museu de História da Medicina do RS contribuir com o projeto “Documentando a Experiências da Covid-19 no Rio Grande do Sul”, preservando a memória e produzindo uma fonte de pesquisa com o objetivo de colaborar com os esforços de compreensão momento difícil em que vivemos de dimensões globais. O MUHM integra o projeto contribuído com narrativas de médicos sobre seu cotidiano no enfrentamento da covid-19, suas experiências, escolhas e sentimentos. A história oral nos possibilita coletar essas memórias, e reconstruir o cenário cotidiano, através dos depoimentos orais e a conjuntura pandêmica em nosso estado. Com certeza a história oral é uma ferramenta importante para coletar narrativas que posteriormente possam ser confrontar com outras fontes, construindo o conhecimento histórico científico, para futuras análises de pesquisadores. E também para que a sociedade possa refletir sobre as políticas públicas implementadas, percebendo como as diferentes categorias profissionais e a população conviveram com a chegada da covid-19, o agravamento da doença, o isolamento social, perda de empregos, vidas e a descoberta da vacina, que nos traz esperança.

7) Você destacaria algumas constatações ou conclusões preliminares a partir das entrevistas realizadas?

Apesar da dificuldade impostas pela pandemia, a equipe do Museu de História da Medicina do RS, está realizando as entrevistas orais, no formato virtual, com os médicos e estudantes de medicina. Iniciamos com atraso a captação dos relatos, devido a agenda apertada dos entrevistados. Os profissionais tem atuado incansavelmente no enfrentamento da covid-19, suas rotinas são intensas o que impactou no seu cotidiano. As primeiras constatações são que os profissionais que estão na linha de frente tiveram que se adaptar rapidamente ao número maior de horas dentro de hospitais, um maior número de pacientes e UTIS lotadas, conviver com perda, e com o adoecimento de colegas e tutores de residência médica. Com relação ao médico maduro, aqueles que já estavam em idade para se aposentar, por serem do grupo de risco, a pandemia provocou a decisão pela aposentadoria, ou a escolha de se afastar das UTIS e dos consultórios. Os estudantes de medicina enfrentam uma rotina longa de aulas online, suspensão de aulas prática e, também exerceram trabalho voluntário durante a pandemia, atuando na vacinação, por exemplo. Todos foram unânimes em considerar o isolamento social como meio de prevenção e a vacina como um meio esperança no enfrentamento da doença. Essas são considerações iniciais e ainda temos muitos profissionais para serem entrevistados.

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